Reportagem

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O up do underground

Por Rafael Flores, Bianca Brito e Bianca Oliveira

O público ouvinte brasileiro ficou muito tempo preso ao que a programação do rádio ou da TV impunha. Não era fácil achar nem mesmo criar modos de se escutar música alternativos aos meios hegemônicos. Isso até a popularização da internet, o que facilitou a criação e a divulgação de informações e foi o principal impulso para o surgimento de um novo ciclo da música independente no país.

Esse ciclo vive atualmente uma de suas melhores fases. Hoje as produções musicais independentes não estão apenas nas duas principais capitais do país, Rio de Janeiro e São Paulo, como costumava ser. Outras regiões, inclusive cidades do interior, passaram a ter um número crescente de novas e importantes bandas no cenário “não mainstream”.

Um exemplo fundamental para a consoli dação desse processo é a criação da rede de coletivos de produção cultural independente, denominado de Fora do Eixo. Esse projeto visa incitar a circulação de bandas por todos os estados do país, promover a troca de conhecimentos sobre tecnologias de produção e a divulgação de produtos da rota batizada de “Circuito Fora do Eixo” (principalmente Norte, Nordeste e Centro-Oeste). Em 2010 sua principal atuação se deu a partir da produção das Noites Fora do Eixo em dezenas de cidades ligadas a rede.

Em pleno interior baiano, 250 pessoas lotaram o pequeno espaço do Viela Sebo Café na quinta-feira, dia 03 de dezembro, para assistir ao show de três bandas baianas: Randômicos, Os Barcos e Maglore. O evento marcava a última Noite Fora do Eixo do ano na cidade. “Ter uma banda local e uma banda convidada nas noites de quintas-feiras permite que as bandas daqui se entrosem com as bandas de fora, façam parcerias, que as bandas de fora circulem por aqui e o público de conquista conheça essas novas bandas. Por exemplo hoje tá tocando Maglore, de Salvador, Os Barcos e Randômicos que são daqui, esse mesmo show, com exceção dos Randômicos, vai acontecer 10 vezes seguidas em 10 cidades diferentes nos próximos 10 dias. Então já é uma parceria incrível que se origina desses shows aqui” comenta Gilmar Dantas durante o evento. GIlmar é um dos integrantes do Coletivo Suiça Baiana, grupo de produtores, comunicólogos, estudantes e pessoas que trabalham com cultura na cidade. Para o público o evento marca também uma nova fase da produção cultural conquistense.

“Vitória da Conquista fica em um local geograficamente estratégico, é a conexão entre o Sudeste e o Nordeste do país, ponto de convergência de Culturas desde sua fundação. Era ponto de encontro dos tropeiros e hoje é uma cidade universitária, a troca de cultura ainda é intensa.” apontou Tales Dourado, vocalista da Randômicos. Talvez seja esse o principal motivo da cidade vir se estabelecendo no cenário musical independente do país, o público é heterogêneo e busca alternativas para o modelo comercial, representado na Bahia pela indústria do Axé.

Thaís Melo, estudante e público fiel da cena underground disse que essa vinha apenas sobrevivendo com alguns shows na Concha Acústica do Centro de Cultura Camilo de Jesus Lima, até o Coletivo começar a produzir eventos no Viela, trazendo bandas que os conquistenses não teriam oportunidade de ver se não viajando pra capital ou pra outros estados. Dois Ícones da música underground do Brasil fizeram shows na cidade, graças ao trabalho do Suiça Baiana, a agressiva banda de metal Matanza e a doce Erika Martins.

A aceitação do público conquistense para esse tipo de show atraiu outros produtores. Como é o caso da dupla Ronny Vox e Vitor Kamikaze que trouxeram pela primeira vez a mais importante banda de rock da Bahia para a cidade, Camisa de Vênus. Na ocasião do show, a própria banda se impressionou com a receptividade do público conquistense.

O conexão Vivo, projeto da operadora de telecomunicações homônimo, é também um projeto importante que em parceria com a Rede Motiva visa impulsionar a produção musical independente no Brasil. Foi responsável por trazer entre julho e agosto dois festivais independentes para Conquista, não só com a presença de bandas, mas de produtores de foa dispostos a discutir e impulsionar esse cenário na cidade. Inclusive o segundo desses eventos foi denominado de Festival Avuador, que faz referência a um dos produtos de exportação da cidade, o famoso biscoito avuador.E a partir disso as bandas locais passaram a ser lançadas em outras regiões, como exemplo d’Os Barcos que tocaram na Etapa de Salvador do Festival Conexão Vivo

“O underground no sudoeste da Bahia não é novo”, admite Tales dos Randômicos, “mas essa efervescência é”.Graças a iniciativas como as citadas aqui, vemos bandas locais com impulso de compor e tocar músicas próprias. Conquista é rica por ter um público grande pra esse tipo de movimento e não deve ficar presa a movimentos puramente comerciais e da produção musical hegemônica.



As Redes Sociais e A Política Brasileira

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Em entrevista, o publicitário Camilo Aggio fala sobre novas tecnologias e como elas têm colaborado para as campanhas eleitorais atualmente.


Tweets, posts no You tube, ringtones, widgets, sms, updates... Em 2010, além de fazerem parte do meio digital, esses termos passaram a constar também no universo eleitoral brasileiro. Camilo Aggio, publicitário, em entrevista coletiva comenta como os candidatos utilizaram as novas tecnologias de comunicação para interagir com os eleitores e como esse eleitorado exerce sua cidadania nas redes sociais. O twitter, rede social que se popularizou no Brasil em 2009 foi responsável por agendar discussões na sociedade "real" e impor esse agendamento aos media de massa nas eleições de 2010. Camilo Aggio responde sobre assuntos relativos a essa e outras redes digitais que influíram na publicidade eleitoral desse ano.

Quais são as vantagens e as desvantagens do uso das novas tecnologias de comunicação na campanha eleitoral de 2010?

Camilo Aggio – Eu não consigo enxergar desvantagens das campanhas online. Não consigo ver desvantagens para o cidadão na medida em que grande parte dos usos que se tem feito dos recursos da internet acabam por promover um maior fluxo informacional, maior quantidade, maior volume de informação política, relevantes, relacionados a projetos, a posicionamentos. Não obstante, isso proporciona que os candidatos sejam mais transparentes e os submetem a uma critica maior dos eleitores. Até essas eleições atuais nós tínhamos uma legislação muito anacrônica nesse sentido das campanhas online do Brasil. Até 2008, os partidos, os candidatos só podiam usar websites. Era vetada a utilização de qualquer outro recurso como, por exemplo, as redes sociais online: Facebook, Myspace, Twitter, Orkut e etc. Isso impunha aos candidatos uma restrição muito grande. Se hoje usamos a internet, estamos basicamente nas redes sócias online. Somos o país que mais utiliza esse tipo de coisa. Agora os candidatos podem chegar mais próximo de nós, podemos acompanhar esses sujeitos cotidianamente, e o mais curioso é que o twitter que vem desempenhando um papel magnífico. O Serra, a Marina, o Plínio e a Dilma utilizam bastante essa ferramenta.

Assim como as revistas, jornais, etc., os novos veículos auxiliam a política a propagação de informações. Você considera que como o maior número de acesso é feito para os jovens, esse público, para a política, segue a mesma tendência ou é algo mais amplo?

C.A. – Eu creio que seja mais abrangente, não creio que seja só para jovens. Eu não tenho uma análise quantitativa, mas a gente sabe que pelo menos a impressão que se tem. Eu tenho pesquisado agora a questão do engajamento da mobilização dos eleitores em torno das campanhas online. O que se percebe é que não são apenas jovens, né? As pessoas que criam ali uma esfera conversacional não são apenas jovens. Essas informações se dão de uma maneira muito complexa e que não respeita exatamente uma faixa-etária restrita. Eu acho que todo mundo que está ali dentro é afetados por um volume de informação muito maior, que não parte apenas das campanhas, que não partem apenas dos veículos de comunicação, mas a partir das discussões que se fazem, das informações passadas por blogs independentes e que são propagadas através das redes sociais.

Os partidos políticos tem feito largo uso das novas tecnologias em favor de suas campanhas. Desses meios, quais são os mais eficazes e qual tem sido a resposta do público?

C.A. - Por um longo período de tempo a gente tinha os websites. Então, a gente tinha um grande problema: você tinha que usar outros mecanismos que não apenas a internet para trazer a atenção desses eleitores, eles teriam que ir ao Google (site de busca da web) e digitar o nome do candidato e a campanha desse candidato teria que rezar para que nas primeiras ocorrências o seu website oficial aparecesse. Agora a coisa não se dá assim. Nós estamos entrando numa uma fase aonde a gente não vai atrás da informação, a gente se depara com ela. Estamos nas redes sociais e essas coisas aparecem através de alguém que você segue como exemplo do twitter, através dos hashtags (categoria de temas acompanhados por #), ou dos trend topics (tópicos mais comentados). Nesse caso, qual é o meio mais eficaz? São as redes sociais, que são onde as pessoas estão, onde se tem a possibilidade compartilhar e de propagar de uma maneira impressionante qualquer tipo de informação.

Qual a sua opinião sobre o uso do You tube na propaganda eleitoral?

C.A. – Fundamental. Primeiro, quando você a analisa a internet pré you tube há um grande problema: os candidatos e suas campanhas não podem produzir muitos vídeos por que elas dependem de um gasto muito grande de aluguel de servidores pra que possam armazenar esses dados, e não obstante a isso, há o problema de como distribuir esses vídeos. Com o you tube a dinâmica de compartilhamento é muito mais interessante. Se você tem um blog, basta colocar um link com a notícia que se quer publicar e o vídeo já pode ser rodado ali mesmo, sem que você precise ser deslocado para outro site para assistir o vídeo. Não apenas isso, as campanhas podem, a partir desse “barateamento” de publicação, tratar de políticas públicas, seus posicionamentos, e podem fazer registros de encontros de determinados grupos de interesses. Portanto há uma diversificação muito grande no que diz respeito ao conteúdo que você pode produzir a partir do formato audiovisual.

Segundo as tendências de 2008 das eleições de presidência para os EUA, a justiça brasileira liberou a campanha dos candidatos livremente pela internert . O que é realmente permitido?

C.A – Tudo é permitido na internet. Os websites tem que ser registrados no TSE, e 48 horas antes das eleições ele tem que sair do ar. As redes sociais foram entendidas como um campo aberto no qual todos têm direito de expressão, internet é uma praça pública, os sujeitos falam o que acham que devem falar, claro, respeitando as leis e os outros. uj

EXEMPLO DE CARTA DO LEITOR

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Na reportagem sobre Indiana Jones, a SUPER se portou como os EUA, que dão qualquer explicação mirabolante para esconder a verdade. Impossível que em Roswell não tenha acontecido nada de estranho. E por que negar que as linhas de Nazca foram feitas por extraterrestres? Há algum problema nisso? O ser humano precisa parar de arranjar explicações mirabolantes para satisfazer suas crenças fanáticas ou o seu ponto de vista racional.

José Roberto Gibim,

Taiúva, SP

CARTA DO LEITOR

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Para o leitor é o meio de expor seu ponto de vista em relação ao assunto lido, para o veículo de informação é uma arma publicitária para saber o que está agradando a opinião pública.

Não há regras estabelecidas para se fazer uma carta no estilo “carta do leitor”, a não ser as que já são preconizadas, ou seja, recomendadas ao escrevermos a alguém: especifique o assunto e seja breve; trace previamente o objetivo da carta (opinar, sugerir, debater); escreva em uma linguagem clara, precisa e nunca faça uso de palavras de baixo calão, pois sua carta não será publicada!

O objetivo do leitor ao escrever uma carta para um jornal da cidade ou uma revista de circulação nacional é tornar pública sua ideia e se sentir parte da informação. A carta do leitor é tão importante que pode ser fonte para uma nova notícia, uma vez que ao expor suas considerações a respeito de um assunto, o destinatário pode acrescentar outros fatos igualmente interessantes que estejam acontecendo e possam ser abordados!

(Brasil Escola)

EXEMPLO DE CRÔNICA

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Mãe

(Crônica dedicada ao Dia das Mães,
embora com o final inadequado, ainda que autêntico.)

Rubem Braga


O menino e seu amiguinho brincavam nas primeiras espumas; o pai fumava um cigarro na praia, batendo papo com um amigo. E o mundo era inocente, na manhã de sol.

Foi então que chegou a Mãe (esta crônica é modesta contribuição ao Dia das Mães), muito elegante em seu short, e mais ainda em seu maiô. Trouxe óculos escuros, uma esteirinha para se esticar, óleo para a pele, revista para ler, pente para se pentear — e trouxe seu coração de Mãe que imediatamente se pôs aflito achando que o menino estava muito longe e o mar estava muito forte.

Depois de fingir três vezes não ouvir seu nome gritado pelo pai, o garoto saiu do mar resmungando, mas logo voltou a se interessar pela alegria da vida, batendo bola com o amigo. Então a Mãe começou a folhear a revista mundana — "que vestido horroroso o da Marieta neste coquetel" — "que presente de casamento vamos dar à Lúcia? tem de ser uma coisa boa" — e outros pequenos assuntos sociais foram aflorados numa conversa preguiçosa. Mas de repente:

— Cadê Joãozinho?

O outro menino, interpelado, informou que Joãozinho tinha ido em casa apanhar uma bola maior.

— Meu Deus, esse menino atravessando a rua sozinho! Vai lá, João, para atravessar com ele, pelo menos na volta!

O pai (fica em minúscula; o Dia é da Mãe) achou que não era preciso:

— O menino tem OITO anos, Maria!

— OITO anos, não, oito anos, uma criança. Se todo dia morre gente grande atropelada, que dirá um menino distraído como esse!

E erguendo-se olhava os carros que passavam, todos guiados por assassinos (em potencial) de seu filhinho.

— Bem, eu vou lá só para você não ficar assustada.

Talvez a sombra do medo tivesse ganho também o coração do pai; mas quando ele se levantou e calçou a alpercata para atravessar os vinte metros de areia fofa e escaldante que o separavam da calçada, o garoto apareceu correndo alegremente com uma bola vermelha na mão, e a paz voltou a reinar sobre a face da praia.

Agora o amigo do casal estava contando pequenos escândalos de uma festa a que fora na véspera, e o casal ouvia, muito interessado — "mas a Niquinha com o coronel? não é possível!" — quando a Mãe se ergueu de repente:

— E o Joãozinho?

Os três olharam em todas as direções, sem resultado. O marido, muito calmo — "deve estar por aí", a Mãe gradativamente nervosa — "mas por aí, onde?" — o amigo otimista, mas levemente apreensivo. Havia cinco ou seis meninos dentro da água, nenhum era o Joãozinho. Na areia havia outros. Um deles, de costas, cavava um buraco com as mãos, longe.

— Joãozinho!

O pai levantou-se, foi lá, não era. Mas conseguiu encontrar o amigo do filho e perguntou por ele.

— Não sei, eu estava catando conchas, ele estava catando comigo, depois ele sumiu.

A Mãe, que viera correndo, interpelou novamente o amigo do filho. "Mas sumiu como? para onde? entrou na água? não sabe? mas que menino pateta!" O garoto, com cara de bobo, e assustado com o interrogatório, se afastava, mas a Mãe foi segurá-lo pelo braço: "Mas diga, menino, ele entrou no mar? como é que você não viu, você não estava com ele? hein? ele entrou no mar?".

— Acho que entrou... ou então foi-se embora.

De pé, lábios trêmulos, a Mãe olhava para um lado e outro, apertando bem os olhos míopes para examinar todas as crianças em volta. Todos os meninos de oito anos se parecem na praia, com seus corpinhos queimados e suas cabecinhas castanhas. E como ela queria que cada um fosse seu filho, durante um segundo cada um daqueles meninos era o seu filho, exatamente ele, enfim — mas um gesto, um pequeno movimento de cabeça, e deixava de ser. Correu para um lado e outro. De súbito ficou parada olhando o mar, olhando com tanto ódio e medo (lembrava-se muito bem da história acontecida dois a três anos antes, um menino estava na praia com os pais, eles se distraíram um instante, o menino estava brincando no rasinho, o mar o levou, o corpinho só apareceu cinco dias depois, aqui nesta pr aia mesmo!) — deu um grito para as ondas e espumas — "Joãozinho!".

Banhistas distraídos foram interrogados — se viram algum menino entrando no mar — o pai e o amigo partiram para um lado e outro da praia, a Mãe ficou ali, trêmula, nada mais existia para ela, sua casa e família, o marido, os bailes, os Nunes, tudo era ridículo e odioso, toda essa gente estúpida na praia que não sabia de seu filho, todos eram culpados — "Joãozinho !" — ela mesma não tinha mais nome nem era mulher, era um bicho ferido, trêmulo, mas terrível, traído no mais essencial de seu ser, cheia de pânico e de ódio, capaz de tudo — "Joãozinho !" — ele apareceu bem perto, trazendo na mão um sorvete que fora comprar. Quase jogou longe o sorvete do menino com um tapa, mandou que ele ficasse sentado ali, se saísse um passo iria ver, ia apanhar muito, menino desgraçado!

O pai e o amigo voltaram a sentar, o menino riscava a areia com o dedo grande do pé, e quando sentiu que a tempestade estava passando fez o comentário em voz baixa, a cabeça curva, mas os olhos erguidos na direção dos pais:

— Mãe é chaaata...

Maio, 1953

A CRÔNICA

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A crônica, na maioria dos casos, é um texto curto e narrado em primeira pessoa, ou seja, o próprio escritor está "dialogando" com o leitor. Isso faz com que a crônica apresente uma visão totalmente pessoal de um determinado assunto: a visão do cronista. Ao desenvolver seu estilo e ao selecionar as palavras que utiliza em seu texto, o cronista está transmitindo ao leitor a sua visão de mundo. Ele está, na verdade, expondo a sua forma pessoal de compreender os acontecimentos que o cercam. Geralmente, as crônicas apresentam linguagem simples, espontânea, situada entre a linguagem oral e a literária. Isso contribui também para que o leitor se identifique com o cronista, que acaba se tornando o porta-voz daquele que lê.

Exemplo de charge

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Charge

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A charge é um desenho ou uma pequena história em quadrinhos que possui um caráter humorístico e crítico. Destacam-se pela criatividade e abordagem de temas da atualidade. Os personagens geralmente são desenhados seguindo o estilo de caricaturas.
As charges são elaboradas por desenhistas e podem retratar diversos temas como, por exemplo, assuntos cotidianos, política, futebol, economia, ciência, relacionamentos, artes, consumo, etc.

Exemplo de editorial

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Mais ou menos?
Dinheiro, poder, status, fama... você consegue viver com MENOS?
icone postado
08.09.2010 | Texto por Paulo Lima,


Talvez a história da vida de John Robbins seja um exagero. Primeira parte: rompe com um império familiar de ice cream dollars, regado a gordura vegetal hidrogenada, e parte deixando para trás uma montanha de dinheiro e um corpo improdutivo. Segue à procura de uma vida mais equilibrada, mergulha em estudos ao longo de anos e, por fim, desvenda boa parte dos segredos da saúde através da alimentação inteligente. Elabora uma tese sobre o assunto, coloca-a num livro bem estruturado que se transforma num best-seller, evidenciando, entre outras coisas, um dos sintomas mais visíveis da doença consumista que assola os Estados Unidos e boa parte do mundo. Faz fortuna com o livro e seus desdobramentos, continua vivendo num lugar relativamente simples, de forma espartana. E aplica todos os seus rendimentos num fundo que prometia não só preservar, mas multiplicar o capital que serviria para garantir sustento e tratamento de seus netos nascidos com danos cerebrais graves. Perde todo seu patrimônio, incluindo a própria casa, nas mãos de um dos maiores escroques da história do capitalismo e parte para escrever um novo livro contando como sua vida de fato melhora, em vários aspectos, depois que os excessos materiais lhe são obrigatória e compulsoriamente subtraídos. OK, talvez estejamos falando de um caso extremo. Mas as parábolas servem mesmo para fazer o ponto.

Mesmo sem necessariamente romper com famílias, com o consumo, com o material, há multidões de pessoas de todos os tipos e de todas as partes repensando veementemente o que fazem com e de suas vidas. Pode até ser que estejamos presenciando o movimento que o prêmio Nobel da Paz de 1989 batizou de revolução espiritual. Muitos anos atrás, quando começou a repetir que havia algo claramente enganoso na ideia de que consumir e acumular aplacariam todas as angústias do indivíduo e debelariam as desigualdades do coletivo, o discurso soava para muitos como idealismo ingênuo e utópico. É da condição humana. Precisávamos sentir na própria carne. Mergulhamos com todas as forças num sistema competitivo insano, sofisticadíssimo e intrincado, através do qual milhões e milhões de pessoas conquistaram, em diferentes níveis, o que se pode considerar uma quantidade mais do que razoável de riquezas e bens materiais. Parece que não funcionou. Desequilíbrio, desigualdade, conflitos, degradação dos espaços e do ambiente, incertezas e crises de proporções inéditas batem por todos os lados.

NOVA ONDA

Esta edição da Trip põe-se a observar traços muito claros de que há uma onda silenciosa de "repensamento". E ela se manifesta, como sempre, de forma diversa.

Na maneira doentia como dirigimos nossos carros pelas ruas do Brasil; no desespero das corporações que veem os talentos saindo cada vez mais pela porta (sem olhar para cargos, poder e dinheiro que ficam para trás), em busca de uma causa ou qualquer coisa que vá além de um plano de bônus + "benefícios"; no sujeito de origem simples que troca opções arrojadas de vida por uma vaga de ajudante num trailer servindo lanches a turistas na praia; ou no camarada que se alista nas linhas da Legião Estrangeira.

Isso sempre existiu? A chamada contracultura propunha exatamente isso? Talvez fossem apenas manifestações isoladas ou movimentos que acabaram engolidos pela eficiente proposta do século passado que pedia vidas em troca da felicidade em forma de patrimônio e consumo. Mas a onda agora parece ser muito mais poderosa e consistente, juntando gotas de todas as origens e contornos e crescendo em tamanho e força inéditos.

Você vai surfar?

Paulo Anis Lima, editor

(Revista Trip)

O editorial

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- Geralmente escrito por um dos responsáveis pela publicação, é o principal texto de opinião num órgão de comunicação. Tem por característica ser opinativo e expressar o pensamento do veículo a respeito de determinado assunto ou tema de envolvimento social descrito na edição, mas podem ser artigos ou críticas compondo a posição do jornal. Na forma, é um discurso claro e tem intenção de motivar o público leitor acerca dos assuntos abordados na edição.

(Carlos Kuntzel)